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sábado, 13 de janeiro de 2018

Artigo: Parque Cultural O Rei do Baião: Uma década cultivando a autêntica cultura nordestina


José Romero Araújo Cardoso
                                                                         
          Cultivar raízes significa expressão máxima de identidade com a formação cultural que denota as bases imateriais de construção coletiva de um povo no realce ao reconhecimento, pilares da ênfase regionalista que precisam dia após dia ser cimentados para que gerações futuras não percam o rumo quanto à permanência e vigência de valores e costumes que caracterizam a altivez de uma raça e que determinam o próprio significado de nação como fundamento de um povo forte e determinado em permanecer ligado a elos coesos que agregam o reconhecimento em fazer parte de coletividades marcadas por ideais comuns bem definidos e alicerçados.
          A presença e a importância do legado Gonzagueano na mentalidade da gente nordestina perfaz um dos mais importantes elos culturais que assegura a continuidade e permanência da idéia acerca de pertencer a uma região, requisito indispensável para a efetivação do reconhecimento e plena aceitação da afetividade que devem direcionar as bases da nordestinidade enquanto expressão cultural regionalista.
          Luiz Gonzaga do Nascimento (13 de dezembro de 1912, Exu, Pernambuco – 2 de agosto de 1989, Recife, Pernambuco) conseguiu de forma sui generis, através de seu talento artístico-musical, amalgamar, na mente dos nordestinos, amor extraordinário às coisas, valores, costumes, fatos corriqueiros do cotidiano da região, etc., os quais caracterizam de forma monumental originalidades referentes ao Nordeste Brasileiro.
          Em torno da fenomenal construção cultural cuidadosamente trabalhada pelo eterno Rei do Baião, surgiram ao longo dos tempos apreciadores e discípulos da fantástica e sublime manifestação de amor ao torrão natal que o saudoso e inesquecível sanfoneiro do riacho da Brígida enfatizou em suas canções maravilhosas, a maioria retratando o nordeste sofrido com o drama das secas e descaso das quase inflexíveis estruturas de poder.
          Asa Branca, gravada em 1947, fruto magistral surgido da parceira com o advogado cearense Humberto Teixeira (5 de janeiro de 1915, Iguatu, Ceará – 3 de outubro de 1979, Rio de Janeiro, Rio de Janeiro), e Vozes das Secas, lançada com coragem e estardalhaço em 1953, composta pelo velho Lua em conjunto com José Dantas de Sousa Filho ( 27 de fevereiro de 1921, Carnaíba, Pernambuco – 11 de março de 1962, Rio de Janeiro, Rio de Janeiro), o célebre Zé Dantas, médico pernambucano que se tornou um dos principais colaboradores de Luiz Gonzaga em sua missão de erguer o nordeste a patamares culturais superiores, sintetizam magistralmente através de seus acordes, melodias e harmonias agruras e tormentas que historicamente afligem a gente nordestina.
          Encantado com a arte do grande nordestino, Chico Cardoso inspirou-se na experiência pioneira realizada pelo próprio Luiz Gonzaga em Exu, estruturando em sertões adustos localizados na zona rural do município paraibano de São João do Rio do Peixe espaço dedicado àquele que conseguiu imortalizar a cultura nordestina em sua expressão máxima.
          Há dez anos, em 2007, surgiu o Parque Cultural O Rei do Baião, cujo trabalho em prol da valorização da autenticidade regional torna-se louvável e expressivo a cada ano que passa, pois constitui lócus magnífico onde o reconhecimento nordestino se faz presente em cada metro quadrado.
          Intercalando-se com a proposta de homenagear Luiz Gonzaga, sua arte e sua influência na música regional nordestina, encontra-se presente tributo merecido a destacadas personalidades do mundo cultural, sobretudo paraibano, cujas influências no âmbito político verificaram-se de forma proeminente, ressaltando a afinidade de Chico Cardoso com a instigante arte de administrar o processo de organização do espaço.  
          O universo conspirou em favor do grande jornalista e animador cultural a ponto de existir nas imediações do Parque Cultural que estruturou comunidade rural denominada Cacimba Nova.
          A Fazenda Cacimba Nova, localizada nos Cariris Velhos, território marcado profundamente pela figura do grande poeta paraibano José Marcolino (28 de junho de 1930, Sumé, Paraíba – 20 de setembro de 1987, Carnaíba, Pernambuco), intitula uma das mais belas canções compostas pelo saudoso menestrel em parceira com Luiz Gonzaga, denominando ainda o lugar de origem de Luiz Pereira de Sousa, o famoso Luiz do Triângulo, corajoso combatente de Princesa, a serviço do Coronel José Pereira (4 de dezembro de 1884, Princesa, Parahyba – 13 de novembro de 1949, Recife, Pernambuco), quando da verdadeira guerra civil ocorrida no Estado da Parahyba em 1930.
          Comandante de um dos destacamentos enviados por Zé Pereira em 28 de fevereiro de 1930 para libertar a família Dantas Villar, aprisionada pelo Tenente Ascendino Feitosa e sua tropa na então Vila do Teixeira, Luiz do Triângulo recebeu título de nobreza na literatura armorial de Ariano Suassuna (16 de junho de 1927, Parahyba, Parahyba – 23 de julho de 2014, Recife, Pernambuco), em célebre trabalho literário intitulado Romance da Pedra do Reino e o Príncipe do Sangue do Vai-e-Volta.
          Valorizando a cultura regional, Chico Cardoso e equipe instituíram concursos que se tornaram concorridíssimos, os quais abrangem de cordel a festival de sanfoneiros, interpretando a arte magistral do eterno Rei do Baião, sem falar de incentivo à produção textual através de crônicas e cartas, cujo enfoque tem sido dado ao universo gonzagueano.
          Consciente de que para preservar tem que cultivar em grau exponencial, a direção do Parque Cultural O Rei do Baião tem fomentado de forma lógica e incondicional ênfase à relação direta entre a originalidade nordestina e as manifestações culturais destacadas nos eventos anuais que são realizados com a finalidade de assinalar a importância da identidade cultural regional através da inspiração no legado do Rei do Baião.
          Contribuir para que o verdadeiro reconhecimento nordestino não seja destruído pelas exigências da pós-modernidade marcada pelo advento fantástico da era assinalada pela revolução técnico-científico-informacional que exige dilapidação e desorganização de culturas originais, um dos fundamentos da globalização, tornou-se um dos motivos de existência do Parque Cultural O Rei do Baião, principalmente quando crise de valores atinge de forma avassaladora todos os quadrantes da nave espacial conhecida como planeta Terra.      

José Romero Araújo Cardoso. Geógrafo. Professor-Adjunto do Departamento de Geografia da Faculdade de Filosofia e Ciências Sociais da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte.


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