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segunda-feira, 20 de maio de 2024

Especial: O artista plástico Rogério Dias

 Por Márcio de Lima Dantas



Integra a geração pós Marieta  Lima, tendo seguido cronologicamente a profícua geração personificada em Joseph Boulier e Varela,  sendo que o que mais se destacou  e se fez grande artista visual foi  Vicente Vitoriano, hoje residindo em  Natal. A arte desse artista que adentra  por muitos caminhos estilísticos do  fazer artístico consolidou-se principalmente por um geometrismo com  forte apelo às pinturas corporais ou  de adereços das etnias indígenas.  Valendo lembrar que o autor não  trabalha com um colorismo que  chame atenção para fortes apelos de contrastes de cores. Há uma  suavidade nos tons selecionados  para aproximar as cores em contrastes. Com efeito, eis que temos  telas com planos justapostos entre cruzando-se em diversas direções.  Se atentarmos com cuidado, veremos uma espécie de centro para  onde os planos confluem, como se  fossem vetores que buscam algo  tal um vórtice, causando um efeito  estético de grande beleza, sobretudo pela leveza das cores e pelo não  uso de excessos cromáticos. O artista contenta-se em compor a partir  de um limitado número de cores,  nunca fazendo uso de sombreamentos ou tons.

A cor permanece  pura dentro do seu plano, o que faz  a beleza é a justaposição de linhas  retas ou linhas curvas, muitas vezes  fazendo uma mescla dos dois tipos.  A obra de Rogério Dias vem de  muito longe. Sempre trabalhou com  arte. Limitei-me aqui ao componente indígena, pois creio que é onde  se expressa com mais propriedade  e bastante capaz de provocar harmonia tendo em vista as tradições  das nossas etnias. Há em sua obra  muito de composições abstratas,  variações indefinidas entre ser concreto ou ser abstrato. De grande importância é o fato do  artista trabalhar na elaboração de  Logomarcas de empreendimentos  comerciais. Embora seja uma espécie de trabalho que se reveste do  funcional, do utilitário, que busca  a identificação de um comércio ou  coisa que o valha, o autor não se  limita a algo que busque puramente  o apelativo e a identificação. Acredito  que é nesse tipo de atividade onde  expressa sua maior capacidade de  artista: o ser capaz de transformar  algo feito para o uso banal de placas,  timbres, escritórios, capas de livros,  em objetos de arte.

Ou seja, o que  tem valor utilitário também detém  valor estético. Não é algo tão simples de se conseguir. Nesse tipo de  atividade se permitiu uma liberdade  que não encontramos em outros  trabalhos. Falo do uso de cores  quentes, fortes, luminosas, dotadas  do poder de chamar atenção para si.  Configurando contrastes inusitados,  combinando o que não é habitual,  em formas que evocam de alguma  maneira o objeto fruto da logomarca.  Gostaria de citar apenas algumas.

As logomarcas da Rádio Centenário,  Granja São Camilo, Cooperativa Terra  Livre e Terra viva, acredito que foi  onde demonstrou sua maestria no manuseio das cores atreladas às formas. São todos de grande imponência e beleza. O triunfo da cor sobre  um plano, numa forma abstrata que  obriga o expectador a refletir qual a  relação entre o ícone que representa determinado objeto ou comunidade  de homens com fim comum. Bem  claro. Rogério Dias é domador de cores, transfigurando objetos e doando apenas a simplicidade de cores  fortes em múltiplas formas.

Fonte: Jornal de Fato.

segunda-feira, 13 de maio de 2024

Projeto Custo de Vida calculou o Custo da Cesta Básica na cidade de Caraúbas-RN

O Projeto de Extensão Custo de Vida, do Departamento de Ciências Contábeis – Campus Avançado de Patu – desenvolvido na cidade de Caraúbas-RN, pesquisou e calculou o custo da cesta básica durante dez meses naquela cidade Oestana. O projeto teve como pesquisadora de campo a aluna bolsista do Curso de Ciências Contábeis, Marcela Alves Braga, sob a coordenação do professor Aluísio Dutra de Oliveira, do Departamento de Ciências Contábeis – Campus Avançado de Patu. O projeto teve como objetivo pesquisar mensalmente as variações de preços a partir de uma cesta básica de produtos,  composta por três grupos de produtos: Alimentação, Higiene Pessoal e Limpeza Doméstica. Na cidade de Caraúbas-RN, a coleta de preços foi realizada em diversos estabelecimentos comerciais, onde teve início no mês de Julho de 2023, permanecendo até o mês de abril de 2024. Os custos das cestas básicas nos últimos dez meses foram os seguintes: Julho/2023: 1.342,49; Agosto/2023: 1.370,04; Setembro/2023: 1.460,17; Outubro/2023: 1.433,43; Novembro/2023: 1.377,90; Dezembro/2023: 1.346,16; Janeiro/2024: 1.448,21; Fevereiro/2024: 1.666,46; Março/2024: 1.446,32; Abril/2024: 1.460,77. A média do custo da cesta básica, nos últimos seis de 2023 na cidade de Caraúbas-RN, foi de R$ 1.388,36, ficando esse valor acima do salário-mínimo vigente no período, que foi de R$ 1.302,00. A média dos primeiros quatro meses de 2024 foi de R$ 1.505,44, também ficando esse valor acima do salário-mínimo vigente que é de 1.412,00. O Projeto Custo de Vida faz parte das atividades de UCE – Unidade Curricular de Extensão – do Curso de Ciências Contábeis, onde alunos do curso aplicam os seus conhecimentos através das atividades de extensão nos seus municípios.


terça-feira, 7 de maio de 2024

Em Patu RN

 


Especial: Além deste sertão: a pintura de Celina Bezerra





É curioso observar a trajetória da profa. norte-rio-grandense Celina Bezerra. Advinda das terras quentes da região do Seridó, de antigas famílias ali chantadas, desde muito, inicialmente dedicou-se ao magistério, tendo se aposentado como professora do Departamento de Educação da UFRN. Pintora bissexta que era, agora dedica-se à literatura e às artes plásticas. Quando disse “curioso” quis deixar implícito o fato de umas das primeiras manifestações artísticas do Homo sapiens foi a pintura nas cavernas, vindo depois as diversas formas não fonéticas de escritura, para depois vir a ser como o que se configurou como elementos da linguagem, nos dias de hoje. Quis com isso lembrar que Celina Bezerra procedeu de maneira inversa: foi da palavra às artes plásticas. De outra feita, não podemos esquecer o belo livro de memórias, com forte conteúdo histórico e etnográfico, escrito conjuntamente com dois irmãos: Meninos de sítios: falando sobre cultura sertaneja (BEZERRA, Celina; ARAÚJO, Laércio Bezerra de; AMMANN, Safira Bezerra. Natal: Gráfica Nordeste, 1997). Os primeiros trabalhos em telas revelam ainda a presença dos seus mestres; vindo, hoje, a definir-se com traço vigoroso e particular, dotada de um pathos que dispõe sua letra e seu número, distintos dos tantos quantos optam por retratar paisagens ou personagens que dizem respeito a nossa geografia humana ou das paisagens encontradas pelo interior afora.

É notável a marca diferente que a dispõe num lugar outro que não o da mesmice de repetir não só os temas recorrentes, mas, sobretudo, a maneira como são dispostos tais elementos, que nos conduz, inexoravelmente, a um travo de déja vu, com forte carga de caricatura, proporcionando a reprodução de literalmente um “quadro”, condizentes com as realidades encontradas hoje, num mundo globalizado, no qual todo lugar se assemelha, tanto em nível comportamental quanto no que diz respeito às edificações. Ao contrário dos muitos que entoam o coro do saudosismo, Celina Bezerra optou por um outro caminho, a saber, compreender a pintura não como conteúdo, mas como forma, como maneira de transfigurar aspectos da realidade de um lugar, o Sertão, desde sempre objeto das artes plásticas produzidas na região Nordeste. 

Para quem está acostumado às representações pictóricas de aspectos relacionados ao sertão -  que fomos acostumados a chamar de “interior”: miséria, seca, cangaceiros, retirantes - pode parecer esquisita uma retratação que refoge a esse lugar comum ou ao horizonte de expectativas do intérprete. Expectativa essa eivada de signos plenos de um discurso dominante que grassa sobretudo nos aceiros por onde anda a classe média, desejosa de se sentir diferente, a partir do contraste com o patético ou o que se apresenta como antípoda de tudo o que se encontra à sua frente e faz de conta que não vê, resultado que é de relações sociais perversas, sobremodo calcada na má distribuição de renda.

Para artistas ou escritores com maior voltagem universal, a noção de sertão despontou como objeto trabalhado esteticamente para além do senso-comum, para além do lugar vincadamente caricatural e factível de ser usado pela mídia como elemento de preconceito, mormente quando se procede ao contraste com as paisagens retratadas do sul/sudeste do Brasil. Refiro-me a autores como Guimarães Rosa, Graciliano Ramos ou Cornélio Pena, nos quais sertão não é um espaço geográfico delimitado, povoado por seres que sofrem o permanente embate com as forças físicas da natureza, perfazendo uma aura de impotência, fatalidade, que apela para o dó e a chamada “solidariedade”. Sertão, como foi representado por esses romancistas, é um lugar mental, espaço íntimo inerente a todo e qualquer senciente, afinal o sofrer, advindo do embate com o meio natural ou resultado de relações íntimas de um eu em desassossego, é parte da condição humana, quer seja de dentro ou de fora. Ora, sofrer é como a morte: só quer uma desculpa, vindo a resumir a condição do homem nos seus confrontos com a realidade. Nesse sentido, sertão é um estado no qual resplende o calor e a transparência dos que caminham pelas veredas da lucidez. Não podemos esquecer que a noção de sertão é anterior a presença lusa em terras brasileiras, provando que não deve ser compreendida como área delimitada geograficamente, mas como um conceito a ser compreendido como advindo de uma determinada experiência histórica. 

Como afirmei, o vocábulo sertão já era usado desde o século XIV para indicar o que se encontrava distante da capital Lisboa que, por extensão, passou a nomear tudo o que era oposto ao chamado mundo conhecido, quer dizer, os vastos espaços que entravam interior a dentro, detendo-se pouca ou quase nenhuma informação acerca deles. Com efeito, não estava muito distante o deslizar semântico, engendrado pelos poetas e romancistas, de sertão como categoria mental, simbolizando os vastos espaços interiores nos quais não chega o poder da Ordem (ego e super-ego), Guimarães Rosa que o diga. Em síntese, sertão não passa de um conceito, de uma imagem construída historicamente.

Na pintura de Celina Bezerra, as ditas paisagens sertanejas são puro pretexto para o hábil exercício dos domínios da técnica de retratar o que está posto no nosso entorno, e que se efetiva através de vastos planos, no qual as cores predominantes são os tons de azul e as nuances de ocre, sintomáticas cores denunciando o equilíbrio entre a alma e o corpo, a imaginação e o empírico, o céu e a terra, cuja simbólica remete à necessária harmonia entre duas dimensões que quase sempre ocupam espaços distintos. Ora, “o sertão está em toda parte”.*

Um gênero tradicional, o paisagístico, numa época tardia como a nossa, em que já se encontra praticamente exaurida a capacidade de reproduzir, atestamos na pintura de Celina Bezerra ainda o fascínio despertado não mais pelo conteúdo, mas por meio da forma, que se constata por pinceladas entrecruzadas, - lembrando um pouco o impressionismo -, feitas de cores neutras ou esmaecidas.

Mais uma coisa, para os que não se convenceram ainda de que o “sertão é o mundo”*, como repisa Riobaldo, o protagonista de Grande sertão: veredas, reporto-me à paisagem da cidade de Paris durante o inverno: tem coisa mais parecida com a nossa Caatinga, quando da estação seca, o que indigitaram como nosso verão? Se lá é o frio, aqui é o tépido, entretanto, ambas as paisagens contém os mesmos elementos: as árvores decíduas perdem suas folhas; a cor predominante é o cinza, os seres ensimesmados, taciturnos, impotentes diante dos elementos físicos que campeiam seu jugo e mando, impondo um certo travo fatalista no olhar, algo parecido com resignação, coisa não tão distante das populações submetidas periodicamente às secas.

Vale lembrar que “sertão” é sinônimo de “interior”. Se no exterior ocorre o embate com as forças físicas, no interior há quase sempre um desconserto consigo mesmo, conduzindo as desavenças que acometem a todos, indiferentes da origem ou etnia. Em suma: digladia-se sempre em duas frentes. Não há como fugir. A bonança é apenas um intervalo entre dois momentos de lidas. 

Quem havera de imaginar que o sertão da escritora e pintora Celina Bezerra, iria ao encontro de concepções sempre avançadas que foram, quando de sua cristalização no campo literário, ou seja, além de SER TÃO vasto quanto as possibilidades humanas, num vergado arco que liga sentimentos antípodas: da alegria à tristeza, do palor à nódoa, do bem ao mal. Tudo numa esquisita harmonia que só a lógica do inconsciente, a lógica da arte permite. De qualquer maneira, “Sertão é o sozinho. Sertão: é dentro da gente”*. E isso ninguém pode negar ou nos tirar: TÃO SER. 

* Falas de Riobaldo.