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Autores
José
Romero Araújo Cardoso
Benedito
Vasconcelos Mendes
Suzana
Goretti Lima Leite
Virgulino
Ferreira da Silva, vulgo Lampião, nasceu a sete de julho de 1897 no
município de Villa Bella, hoje Serra Talhada, Estado de Pernambuco,
e foi registrado no cartório da sua cidade natal a doze de agosto de
1900, conforme registro de nascimento reproduzido por Carvalho
(1974). Era filho de José Ferreira dos Santos e Maria Sulema da
Purificação, sendo defendido por diversos autores que pertencia a
família Feitosa, dos Inhamuns, no Estado do Ceará. Com relação a
esta possibilidade assim se expressa Macedo (1975, p. 25);
“se é
verdade que o capitão Virgulino vinha do tronco Feitosa dos
Inhamuns, a violência do sangue, de fato, era-lhe muito antiga.
Família velha como o sertão dos sesmeiros e povoadores, dividia, no
sul do Ceará, nos Inhamuns, o poderio com os Montes, outro clã de
sangue quente e muito derramado naquelas paragens.”
A primeira
referência a esta vinculação genealógica de Virgulino Ferreira da
Silva com a valente família cearense encontramos em seu biógrafo
pioneiro, o jornalista paraibano Érico Gomes de Almeida, quando
escreveu a obra, intitulada “Lampeão, sua história”, escrita
em1926 quando a fama do bandido atingia proporções
exponenciais.
Quanto ao físico e indumentária, Leonardo Motta,
célebre folclorista cearense, assim o descreveu;
Amulatado,
estatura meã; magro e semi-corcunda; barba e nuca ordinariamente
raspados e sempre que é possível perfumados; na perna esquerda
encravada uma bala, com que o alvejou o sargento “Quelé”, da
polícia parahybana; o olho direito branco e cego, escondido pelos
óculos pardacentos, de aros dourados; mãos compridas que se
assemelham a garras; os dedos cheios de anéis de brilhantes falsos e
verdadeiros; ao pescoço, vasto e vistoso de cor berrante, preso ao
lado por valioso anel de doutor em direito; sobre o peito, medalhas
do padre Cícero, escapulários e saquinhos de “rezas fortes”,
chapéu de cangaceiro, tipicamente adornado de correias e metal
branco; ensimesmado toda vez que defronta uma turma de curiosos;
folgazão quando entre poucos estranhos ou no meio de comparsas; não
se esquecendo de um guarda costa à direita sempre que desconhecidos
o rodeiam; paletó de camisa de riscado, claro, calças de brim
escuro; alpercatas reluzentes de ilhozes amarelos; a tira-colo, 2
pesados embornaes de balas e bugingangas, protegidos por uma coberta
e chales finos; tórax guarnecido por 3 cartucheiras; ágil como um
felino mas aparentando constante estropiamento e exaustão; às mãos
um fuzil; à cintura duas pistolas “parabellum” e um punhal de 78
centímetros de lâmina. (In: Araújo, 1982, p. 76)
A vida
antes e depois de entrar para o cangaço:
Virgulino
Ferreira da Silva levava vida normal como qualquer outro sertanejo
antes de adentrar o cangaço, campeando o gado na caatinga, correndo
em vaqueijadas, trabalhando em artesanato de couro e auxiliando o pai
como almocreve. Esta última atividade certamente favoreceu-lhe
bastante no conhecimento profundo das veredas do sertão. Gueiros
(1953, p. 11) faz referências às façanhas de Lampião quando
vaqueiro na adolescência, frisando que era respeitado e admirado nas
ribeiras do riacho de São Domingos, que cortava a propriedade dos
seus pais em Villa Bella.
Um pretenso roubo de chocalhos foi o
responsável pelas primeiras escaramuças contra uma família antes
amiga, ligada aos Ferreiras por fortes laços de compadrio. Os
Saturninos da Pedreira, em alusão a propriedade Pedreira que
situava-se vizinha às terras da família de Lampião, são apontados
como pivô das refregas nos longínquos anos finais da década de
1910 do século passado, conforme Macedo (1975, p. 29-35).
Lampião
estreou na senda do crime em seu estado natal, mas foi com a fixação
de sua família em Alagoas, devido a acordo informal mantido com os
rivais, que provocou a transferência de sua família para a não
menos violenta localidade de Matinha de Água Branca (AL), onde ficou
protegido pelo “coronel” Ulisses Luna. Foi em Alagoas que houve
de fato a sua inserção no cangaço, bem como a de alguns irmãos
seus à exceção de João Ferreira e Ezequiel, que depois se
integraria também ao bando.
Ataques cruéis entre os anos
iniciais da década de 1920 às localidades de Pariconhas, Espírito
Santo e Poço Branco, todas no estado Alagoano, são apontados como
as façanhas que renderam notoriedade regional aos irmãos Ferreira
(Maciel, 1985, p. 15-29), embora a façanha que de fato lhe deu mais
destaque tenha sido o saque à residência da Baronesa de Água
Branca, residente em Água Branca (AL), Dona Joanna Vieira de
Siqueira Torres (idem, p. 38-43).
Lampião
serviu ainda como cangaceiro ao seu conterrâneo Sebastião Pereira e
Silva, conhecido por Sinhô Pereira, que movia luta sem trégua
contra os Carvalhos da mesma localidade de Villa Bella. Quando o
comandante Sinhô Pereira deixou o sertão e fugiu para o estado de
Goiás, foi a Lampião que o velho guerreiro do Pajeú entregou a
chefia do bando (Macedo, 1975, p. 36-42).
Durante os
vinte e dois anos que se entregou à vida bandoleira, Lampião não
costumava penetrar no Piauí e na zona norte do estado do Ceará. No
norte cearense nunca contou com o apoio do coronelato como na região
sul, cuja estruturação de valhacoutos com certeza tenha garantido
certo sucesso em suas empreitadas.
O número de companheiros em
armas oscilava bastante. No início da carreira era reduzido, mas
aumentou consideravelmente quando da sua ascensão a chefe do bando
de Sinhô Pereira no ano de 1922, registrando-se provavelmente maior
número de componentes quando do desfile de cento e cinco cangaceiros
por ele chefiado a dois de setembro de 1926, na cidade de Cabrobó,
estado de Pernambuco (Oliveira, 1985, p. 33). Em quatro de março do
mesmo ano havia comparecido à cidade do Juazeiro do Norte (estado do
Ceará), a convite do Dr. Floro Bartholomeu da Costa, amigo do Padre
Cícero Romão Batista e líder político do sul do Ceará, para que
fizesse parte dos Batalhões Patrióticos organizados pelo Presidente
Arthur Bernardes que combatia o foco insurgente dos revoltosos
comandados pelos oficiais do Exército Brasileiro, Miguel Costa e
Luís Carlos Prestes,a conhecida Coluna Prestes. Nesta ocasião
recebeu a falsa patente de “Capitão” das mãos do Padre Cícero.
No ano de 1928, que marca a fuga dramática para os sertões
baianos,em razão da repressão desmedida feita pelas polícias do
Rio Grande do Norte, Ceará e Paraíba desencadeada por causa do
frustrado ataque à cidade de Mossoró (estado do Rio Grande do
Norte), ele se encontrava na companhia de apenas quatro bandoleiros.
Lampião
buscava nos fenômenos e coisas da natureza a inspiração para os
apelidos dos seus cangaceiros. Por isso registraram-se diversos
bandidos com os nomes de jararaca, corisco, jandaia, jitirana,
vereda, limoeiro, etc. Quando um cangaceiro morria seu apelido era
herdado por outro cangaceiro que entrava no bando. Utilizava ainda a
identificação dos seus subordinados a partir do local de origem, a
exemplo dos celebérrimos José Baiano e Sabino das Abóboras.
Abóboras era uma fazenda entre as cidades de Serra Talhada e Triunfo
no estado de Pernambuco.
Mello (1985.p. 90-91), enfatiza que;
Durante
as duas décadas que compõem o seu período de correrias bem para
além do que a ficção possa engendrar, chegou a exercer concreto
domínio sobre áreas dos sertões de sete Estados do Nordeste, tendo
o seu grupo em ocasiões de maior sucesso ido além dos cento e vinte
componentes. Foram seus asseclas, num primeiro plano Antônio
Ferreira da Silva, o Esperança; Livino Ferreira da Silva, que também
se assinava Livino Ferreira dos Santos ou, ainda, Livino Ferreira de
Souza, o vassoura, Ezequiel Ferreira da Silva ou Ezequiel Profeta dos
Santos, o Ponto Fino; o seu cunhado Virgínio, o Moderno; e o seu
diletíssimo amigo Luís Pedro Cordeiro, o Luís Pedro, todos mortos
no cangaço. Em plano levemente inferior, vale citar os cabras Sabino
Gomes de Góes, o Sabino; Antônio Rosa, o Antônio do Gelo; Cristino
Gomes da Silva Cleto, o Corisco; José Leite de Santana, o jararaca;
José Baiano, bandido que conduzia um ferro de gado com as suas
iniciais, destinado a marcar mulheres nas faces, coxas ou nádegas,
desde que usassem cabelos ou vestidos curtos; Ângelo Roque da Costa,
o Labareda; Sátiro de tal, o Gato; Antônio Ribeiro, o José Sereno;
Mariano Laurindo Granja, o Mariano, e mais os cabras Português e
Moita Braba, todos tendo ascendido à chefia de seu
subgrupo.
Principais cidades atacadas:
Lampião
protagonizou façanhas espetaculares, a exemplo da fuga desesperada
em direção ao sul do estado do Ceará após o frustrado ataque de
13 de junho de 1927 à cidade de Mossoró, segunda maior núcleo
urbano do estado do Rio Grande do Norte (Fernandes, 1999). Acossados
por policiais de três estados (Rio Grande do Norte, Ceará e
Paraíba), os cangaceiros conseguiram furar cercos
intransponíveis.
No entanto, a mais ousada investida do grupo de
Lampião não contou com a participação do chefe, quando a 27 de
julho de 1924 seus irmãos comandando o bando, unidos ao de um
cangaceiro paraibano de nome Francisco Pereira Dantas, conhecido por
Chico Pereira do Jacu, da localidade de Nazarezinho, invadiram a
cidade de Sousa (estado da Paraíba), conforme Nóbrega (1989, p. 71)
e Mello (1985, p. 135). A ousadia dos bandidos resultou na perda do
imprescindível valhacouto na região serrana que faz a divisa dos
estados da Paraíba e Pernambuco. Houve empenho do mandonismo local e
do governo paraibano na captura dos cangaceiros, embora revezes
dignos de notas tenham acontecido às tropas destacadas para as
missões, a exemplo do célebre combate de Serrote Preto no estado de
Alagoas, quando a milícia da Paraíba foi quase que totalmente
destroçada em tocaias fenomenais. O recrudescimento das perseguições
a Lampião resultou na morte de Livino Ferreira, na localidade
Tenório de Flores do Pajeú (estado de Pernambuco), embora a vindita
do cangaceiro tenha sido marcada pela violência inaudita, atingindo
populações indefesas de lugarejos perdidos nos confins da serra da
Bernarda em Princesa (estado da Paraíba). O novo posicionamento da
classe dominante desta região sertaneja do estado da Paraíba quanto
ao tratamento aos bandidos personificou-se na instalação de um
batalhão da Polícia Militar em Patos das Espinharas, no governo de
João Suassuna (1924-1928), concentrando a atuação na fronteira com
o estado de Pernambuco, epicentro do cangaceirismo por causa da
proximidade com o vale do Pajeú, considerado o “celeiro dos
bandidos”.
Principais coiteiros de Lampião e a repressão
do governo:
Como
forma de tentar se desvencilhar da mácula de ter homiziado
cangaceiros, o chefe político de Princesa (PB), “Coronel” José
Pereira Lima, que no início da década de Trinta do século passado
moveu uma luta encarniçada contra o governo do presidente paraibano
João Pessoa Cavalcanti de Albuquerque, financiou uma resposta
erudita aos comentários propalados por Lampião de que o político
sertanejo havia-lhe usurpado certa quantia em dinheiro que o
cangaceiro lhe havia confiado, transformando-o numa espécie de
banqueiro informal sem juros. O referido “coronel” encomendou ao
jornalista paraibano Érico Gomes de Almeida a confecção de uma
obra que traçou o perfil do bandido de forma bastante negativa,
intitulada “Lampeão, sua história”, constituindo-se na primeira
biografia erudita de Virgulino Ferreira da Silva, que foi publicada
em 1926.
Perseguido tenazmente pelas volantes paraibanas,
Lampião não voltou mais à Paraíba, onde quem de fato o protegia
era Marcolino Pereira Diniz, imortalizado por Luiz Gonzaga e Humberto
Teixeira no baião “Xanduzinha”, gravado em 1950, que enaltecia o
“caboclo Marcolino”.
Seu apogeu começou a declinar após o
mais impressionante feito de sua vida à margem da sociedade
convencional, que foi a tentativa frustrada de saquear a cidade de
Mossoró. Depois deste episódio seu eixo de atuação teve que ser
radicalmente revertido.
Seus coiteiros mais importantes
foram Antônio da Piçarra, de Brejo Santo (estado do Ceará), Ângelo
da Jia, de Tacaratu (estado de Penambuco), “Coronel” Marçal
Florentino Diniz e Laurindo Diniz, ambos de Princesa Isabel (estado
da Paraíba), Marcolino Pereira Diniz, dos Patos de Irerê e também
da região limítrofe da Paraíba com Penambuco. A repressão aos
agentes patrocinadores do cangaço, principalmente após a tentativa
de saque a Mossoró, é destacada por Mello (1985, p. 116), quando
relata que;
Às
voltas com o grave problemas das deserções que se seguiram ao revés
em Mossoró, Lampião chega ao Pajeú, deparando-se com os primeiros
e nada desprezíveis efeitos de um plano de governo concertado ainda
no início do ano. É que com o advento do governo Estácio Coimbra,
o novo chefe de polícia de Pernambuco, Eurico de Souza Leão, havia
estabelecido novas diretrizes à repressào ao banditismo. O ponto
central de sua firme orientação repousava no combate sem trégua
aos coiteiros. Um a um iam descendo presos para a capital alguns dos
principais aliados do cangaço. De Custódia, descem dois políticos
influentes; de Tacaratu, o fazendeiro Arsênio Gomes; de Serra
Talhada, o comerciante Ascendino Alves de Oliveira e o chefe
político, “coronel” José Olavo de Andrada; de Rio Branco,
descem mais alguns coiteiros, até que finalmente é preso o
“coronel” Ângelo Lima, conhecido como Ângelo da Jia, à época
o maior deles. A ação corajosa de Estácio Coimbra contra homens
que, juntos, representavam milhares de votos, tira as muletas aos
bandido. Sem o coiteiro o cangaceiro não é nada.
Lampião
passou a agir no estado baiano no ano de 1928, inicialmente sob a
proteção do “Coronel” Petronilo de Alcântara Reis. Durante um
ano o “rei do cangaço” esteve longe das refregas e escaramuças,
mas a traição do coiteiro que o recebeu na Bahia fê-lo voltar à
ativa, com força redobrada e com uma perversidade inexplicável. O
governo baiano passou a oferecer a quantia de cinqüenta contos de
réis para quem, civil ou militar, o trouxesse às autoridades
competentes de qualquer forma, vivo ou morto.
Contudo, apesar de
todos os esforços olvidados, o estado da Bahia não estava preparado
para enfrentar as artimanhas da guerra de guerrilhas de Lampião.
Precisava-se que homens acostumados às suas estratégias fossem
convocados para a luta contra o banditismo rural. Vieram,
principalmente de Pernambuco, guerreiros das caatingas que conheciam
todos os segredos da arte da guerra de Lampião, com destaque ao clã
dos Nazarenos, famosos perseguidores do bandido e aquele que foi o
matador de Corisco, “o diabo louro”, José Osório de Farias, o
célebre José Rufino.
Maria Bonita, a mulher de Lampião
Mas não
só de estripulias nas caatingas baianas, alagoanas e sergipanas
viveu Lampião e o seu bando recomposto nesta fase que ele inaugurou
quando transpôs o rio São Francisco. Virgulino Ferreira da Silva
encontrou no município de Jeremoabo (estado da Bahia), numa
propriedade conhecida por Malhada da Caiçara, a companheira que o
seguiu até os últimos momentos. Chamava-se Maria Déa de Oliveira,
a qual passou à história com o apelido de Maria Bonita, a “rainha
do cangaço”. Corria o ano de 1930 e a cabocla sertaneja tinha
menos de vinte anos de idade, sendo na ocasião casada com um
sapateiro conhecido por José de Nenén. Maria Déa deixou o marido
para acompanhar Lampião, causando a estranheza do comandante Sinhô
Pereira quando da entrevista a Macedo em julho de 1975, cuja
assertiva fomentou que nunca permitiu e nem permitiria a presença
feminina no cangaço.
Mulheres se
destacaram como bravas guerrilheiras, como a famosa Dadá, esposa de
Corisco, ferida em combate no qual pereceu o valente cangaceiro que
vingou Lampião.
Tiveram vários filhos, mas apenas uma
sobreviveu, a qual recebeu o nome de Expedita. Nasceu em plena seca
de 1932 no estado sergipano e foi entregue a coiteiros de confiança
para que não se expusesse a agrura do cangaço. Foi criada por um
vaqueiro de nome Severo Mamede que trabalhava na fazenda Exú,
propriedade de um fazendeiro de nome Zequinha Andrade, que era
compadre de Lampião. Havia acertado com Lampião para que o vaqueiro
ficasse com a menina logo de pois do nascimento (Araújo, 1982, p.
17).
Documentário cinematográfico:
Lampião
se deixou filmar por um aventureiro de origem libanesa de nome
Benjamin Abraão Botto. Secretário particular do Padre Cícero,
Benjamin já havia tido contato com o cangaceiro quando este foi
convocado por floro Bartolomeu da Costa para comparecer ao Juazeiro
do Norte (CE) e receber uma falsa patente de Capitão do Exército
Brasileiro. Com a morte do Padre Cícero Romão Batista em 1934,
tentou convencer a empresa fotográfica ABA Filmes de Fortaleza
(estado do Ceará) a incentivar sua aventura pelas caatingas baianas,
encontrando o bando após inúmeros contatos com a malha protomafiosa
de coiteiros que o assessorava nas investidas criminosas.
Realizado
o filme e extensas sessões de fotografias com todo o grupo, Benjamin
Abraão Botto não viveu o bastante para ver o resultado dos seus
trabalhos cinematográfico e fotográfico. Foi assassinado de forma
misteriosa no ano de 1937, enquanto Lampião e o bando, acossados com
a repressão policial, teriam pouco tempo de atuação.
De
acordo com Mello (1985, p. 199);
A
habilidade do cinegrafista verdadeiramente das arábias chegou a
ponto de lhe permitir, num requinte mercadológico, a obtenção de
uma declaração passada e, o que é ainda mais incrível, futura e
exclusividade para o documentário elaborado, constando esta de uma
carta de próprio punho do bandido, que Abraão faria publicar com
grande alarde e em fac-símile na edição de 18 de fevereiro de 1937
do Diário de Pernambuco. (...) É fácil avaliar a irritação do
presidente Getúlio Vargas e do seu Departamento de Imprensa e
Propaganda. Começava a contagem regressiva para a destruição do
cangaceiro-mor. Afinal, como seria possível modelar um Brasil novo
com Lampião espiando do terreiro?
O documentário
elaborado por Benjamin Abraão Botto se responsabilizou pelo
esclarecimento de vários subterfúgios dos coiteiros que
assessoravam o cangaceirismo no Nordeste brasileiro, descortinando
para os sulistas como estava montado o poderoso esquema que garantia
parte do sucesso que Lampião alcançava.
A
morte de Lampião
No
dia 28 de julho de 1938 o grupo descansava às margens do riacho
Angico, um pequeno afluente do rio São Francisco do lado sergipano.
Uma volante sob o comando do tenente João Bezerra, auxiliada pelo
aspirante Francisco Ferreira de Mello e pelo sargento Aniceto,
conseguiu finalmente alcançá-los na grota de angicos, município de
Poço Redondo, travando-se um tiroteio no qual onze cangaceiros e um
soldado foram mortos, colocando-se um ponto final na atribulada
atuação de Virgulino Ferreira da Silva como o mais bem sucedido
chefe de bando do Nordeste Brasileiro. Segundo Araújo (1982, p. 34)
até hoje não se sabe ao certo o nome de todos que tombaram em
Angico. Recorrendo a imprescindível colaboração de ex-cangaceiros,
como Dadá, Cila, Zé Sereno, Criança, Pitombeira e Balão
relacionou Quinta-feira, Maria Bonita, Luiz Pedro, Mergulhão,
Elétrico, Enedina, Cajarana, Tempestade e Marcela.
Nas
proximidades da área onde foi travado o último combate do “rei do
cangaço”, no qual ele não conseguiu disparar um único tiro,
estava a volante dos Nazarenos, que buscava a todo custo reivindicar
a glória pela morte de Lampião. Consideraram o objetivo alcançado
pelo oficial alagoano uma afronta, pois quem era para ter liquidado
com o bandido deveria ter sido eles. Passaram quase duas décadas
seguindo os seus passos. Suspeitava-se que João Bezerra realizava
negócios escusos com Lampião, fornecendo-lhe armas e
munição.
Procedida à rapina usual quando dos combates e mortes
de cangaceiros, os corpos foram degolados e as cabeças levadas
primeiro para a cidade de Piranhas (estado de Alagoas), palco de
diversas tropelias de Lampião, inclusive de um ataque formidável
quando a cangaceira Inacinha, esposa de um bandido apelidado Gato,
havia sido capturada pela volante liderada pelo mesmo homem que
comandou a chacina de Angicos.
As cabeças dos cangaceiros mortos
foram levadas para o Instituto Médico Legal Nina Rodrigues, em
Salvador (BA), onde foram estudadas pacientemente a fim de que
revelassem sinais de degenerescências lombrosianas, tendo em vista
que as teorias do médico-antropólogo italiano estavam em voga na
época como forma de explicar a inserção de cidadãos comuns no
mundo do crime.
Em maio de 1969, depois de mais de três décadas
finalmente o que restou dos cangaceiros mortos em angicos foi
enterrado no cemitério das Quintas, em Salvador, capital baiana,
devendo-se a isso, em parte, à pressão do Dr. Sylvio Hermano de
Bulhões, filho de Corisco e Dadá, que mobilizou a opinião pública
para que pusessem fim a exposição bárbara dos restos mortais dos
principais expoentes do ciclo épico do cangaço no século
20.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
ALMEIDA, Érico de. Lampeão, sua história. Parahyba/PB: Imprensa Official, 1926.
ARAÚJO, Antônio Amaury Correia de. Assim morreu Lampião. São Paulo/SP: Traço Editora Ltda., 1982.
CARVALHO, J. Rodrigues de. Serrote Preto: Lampião e seus sequazes. 2. ed. Rio de Janeiro/RJ: SEDEGRA S/A – Gráficos e Editores, 1974.
FERNANDES, Raul. A marcha de Lampião – assalto a Mossoró. 4. ed. Mossoró/RN: Fundação Vingt-un Rosado, 1999 (Coleção Mossoroense, Série “C”, Vol. 1074).
MACIEL, Frederico Bezerra. Lampião, seu tempo e seu reinado (II – A Guerra de Guerrilhas – Fase de vinditas). Petrópolis/RJ: Vozes, 1985.
MACEDO, Nertan. Lampião – Capitão Virgulino Ferreira. 5. ed. Rio de Janeiro/RJ: Editora Renes, 1975.
_________. Sinhô Pereira – O comandante de Lampião. São Cristóvão/RJ: Ed. Artenova S. A., 1975.
MELLO, Frederico Pernambucano de. Guerreiros do sol: O banditismo no nordeste do Brasil. Recife/PE: FUNDAJ / Ed. Massangana, 1985.
NÓBREGA, F. Pereira. Vingança, não – Depoimento sobre Chico Pereira e cangaceiros do Nordeste. 3. ed. João Pessoa/PB: Departamento de Produção Gráfica, 1989.
OLIVEIRA, Aglae Lima de. Adriana – A vida de uma professora no Estado de Pernambuco no tempo de Lampião. 2. ed. Recife/PE: FUNDARPE,1985.
José Romero Araújo Cardoso - Prof. do departamento de geografia da Faculdade de Filosofia e Ciências Sociais da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte.
Benedito
Vasconcelos Mendes - Prof. do departamento de geografia da Faculdade
de Filosofia e Ciências Sociais da Universidade do Estado do Rio
Grande do Norte.
Suzana
Goretti Lima Leite – Advogada e Pedagoga. Membro da Academia
Mossoroense Feminina de letras.
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