Por
Márcio de Lima Dantas
Professor do Departamento de
Letras da UFRN
Rayron Montielly de Lima Costa nasceu
em Mossoró em 30 de dezembro de 1990. Suas primeiras imagens pictóricas
remontam ao fato da mãe ser costureira para si e para as irmãs. Tal atividade
lhe despertava atenção. O corte do tecido em partes e depois costurar as peças
num todo, criando uma peça do vestuário, com suas combinações e adornos.
Ainda bastante jovem, e
experimentando as técnicas e a justaposição de cores, na sua obra produzida até
agora, divisa-se um talento que, com a disciplina e o domínio técnico, virá a
ser um dos principais expoentes das artes plásticas produzidas em Mossoró.
Visto haver no seu trabalho e na sua fala uma consciência assumidamente
experimental. Ou seja: a dynameis aristotélica busca o seu número, o seu âmbito
e sua inquieta vontade do vir-a-ser. O futuro insculpirá o pintor em alguma
tradição das artes plásticas em Mossoró.
O conhecimento da geometria vem do
ensino médio, no qual se sentiu fortemente atraído pelo Teorema de Pitágoras.
Não só entendeu com bastante propriedade, mas viu como utilizá-lo nas artes
plásticas. Sobretudo que efeito causaria o seu manuseio, gerando infinitas
possibilidades de apreensão e composição.
Tenho para mim, que em sua
curiosidade, passou a inquirir acerca das formas geométricas que nem sempre se
manifestam nos objetos, contudo estão ocultas, subentendidas, possibilitando
conferir uma outra ordem que não a do chamado real concreto, implicando numa
harmonia, assim como um vestido depois de pronto.
Esboçarei uma classificação
provisória e creio não abarcar tudo o que produziu, na medida em que tive
acesso apenas a uns poucos trabalhos. A saber: o retrato de pessoas desenhados
em lápis grafite, as telas, o grafite mural, em portões e muros e a pintura
acrílica sobre tela, com forte caráter de representação naturalista.
Em algumas telas e no grafite mural,
apropria-se de maneira livre da imagem das dobras de papel do Origami japonês
para compor panos-de-fundo no qual insere imagens figurativas, muitas vezes de
caráter regional, com fortes traços emanados da xilogravura. Procede desse
modo, a uma ousada síntese entre culturas tão distintas, no qual a aproximação
de duas tradições logrou êxito no seu intento.
Os polígonos de três lados, com
predominância do triângulo retângulo, quase sempre em cor pastel, refratando a
cor mais ardente, engendra um efeito elegante de ocupação do espaço ou do
suporte no qual se encontra impresso. Os triângulos tanto são sobrepostos como
formam ângulos entre si, numa cadeia causadora de um efeito bastante agradável
de se contemplar, sobretudo quando o suporte não é uma tela ou uma parede,
obtendo forte poder decorativo, como no caso do trailer amarelo, no qual
funciona uma tabacaria. Sendo que aqui, durante a noite, é iluminada
interiormente por uma luz infravermelha ou superazul, causando no expectador a
ilusão de relevo e profundidade. O efeito estético é precioso, na medida em que
um objeto que foi edificado para um deter valor utilitário passa a adquirir
estatuto de obra de arte. É uma apropriação bastante interessante enquanto
intervenção urbana, pois sucede uma reinterpretação de um suporte que integra a
paisagem, interagindo ao transformar algo prosaico em objeto de arte.
Nesse primeiro momento da sua
produção artística, o triângulo parece se inscrever como seu mito obsessional,
haja vista que também se manifesta nas telas e nos grafites, agora não mais
como o elemento que define o núcleo ideativo da obra, mas como espécie de
horizonte em segundo plano nos quais o figurativo promete gerar o signo
pictórico, ou seja, o “assunto” da tela. Basta ver os quadros nos quais estão
presentes Lampião e Maria bonita. Há uma deliberada e livre vontade, uma
consciência do efeito causado quando do uso do polígono de três lados como
elemento da composição, gerando inusitado conjunto pictórico. Mormente quando emprega técnica do stencil e da tinta spray.
Com relação ao grafite, é de somenos
importância dizer o consabido. Está ligado ao movimento Hip Hop (EUA, 1970),
configurando-se como uma das três vertentes desse movimento de crítica ao status quo da sociedade americana,
oriundo que é da comunidade negra e latina, Brooklin e Bronx. O grafite é uma
das três vertentes no qual se plasmou: o rap (música), o break (dança) e o
grafite (pictórico).
Rayron expressa-se de múltiplas
formas, estendendo-se num arco de envergadura tensa que vai do figurativismo ao
abstrato, deixando entrever tradições de culturas várias: arte negra, japonesa,
nordestina. Ancorando-se consciente ou inconscientemente no espírito que
engendrou o movimento inicial do grafite, que se manifestou como forma de
questionar o isolamento e o preconceito contra determinadas populações ou
etnias.
Enfim, tratarei do desenho e da
pintura de cunho naturalista, no qual demonstra sua habilidade com as formas
clássicas de representação do real. Aqui estão presentes os trabalhos com lápis
grafite de pessoas, num jogo de luz e sombra, representando com bastante
propriedade o ethos das pessoas, por
meio de uma habilidade em capturar pelos lábios e pela expressão dos olhos o
que eventualmente dá contorno à alma.
Tenho para mim, que a tela do caju
amarelo, dos pares de jambos fúccia e da pitaia, fruta do cacto, são uma
espécie de prova dos nove, se resta a alguém alguma dúvida sobre o talento e as
potencialidades vindouras desse jovem artista das terras quentes de Mossoró.
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