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quarta-feira, 17 de abril de 2024

Especial: Edilson Araújo: verde que te quero verde.

Por Márcio de Lima Dantas.

Verde que te quiero verde. 

Verde viento. Verdes ramas.  

El barco sobre la mar 

y el caballo en la montãna. 

Federico Garcia Lorca 




A pintura de Edilson Araújo (Ouro Branco RN, 1950) estabelece relações com diversas  tradições e personalidades no âmbito das artes visuais. Mas primeiro vou me debruçar sobre aspectos dessa pintura, eivada de uma opulenta singularidade quando posta, para  efeito de comparação, ao lado de outras produzidas no Rio Grande do Norte. Falo desse  conjunto de artistas filiados à chamada representação naif. Com efeito, hoje, o estado do  Rio Grande do Norte nada deve a ninguém, não apenas por deter autodidatas de extrema  beleza e domínio técnicos, capazes de compreender exatamente o que estão fazendo, bem  como ter esses artistas integrando acervos públicos ou galerias de arte. 

E se a maioria, só para ficar em um exemplo, não manuseia a perspectiva, buscando a  profundidade, nem por isso invalidada a qualidade técnica e o reconhecimento não só do  meio artístico, que quase sempre integra o acervo de exposições coletivas e individuais,  mas de fazerem parte do mercado da arte. Consabido é de o quão laborioso se faz colocar  obras de determinados pintores em um mercado muito concorrido, no sentido de que nem  sempre há pessoas interessadas em adquirir obras de arte. Sendo assim, tarefa árdua a de  deter um público de gente com interesse de não apenas chancelar a qualidade de um pintor  e sua obra, mas ir para além dos elogios, adquirindo telas para se firmar como alguém  que sabe da estética como integrante do modus vivendi de uma determinada coletividade. 

Sim, antes de adentrarmos pelos principais aspectos da obra de Edilson Araújo, gostaria  de evocar o fato de termos na historiografia das artes visuais uma das mais importantes,  ou melhor, talvez a mais importante do Rio Grande do Norte. A saber, foi aqui que nasceu  e dedicou sua vida ao trabalho: Maria do Santíssimo (São Vicente RN, 1890- idem 1974).  Uma vida plena de curiosidades, repleta de enigmas, ao retratar por meio de pincéis feitos  de palitos de coqueiro, e como tinta, a anilina, e que as categorias da Arte não alcançam, sentem dificuldades em dar conta, dada a fartura de pequenos paradigmas, lançando seus  vetores simbólicos para certas auras que só a noção de arquétipos podem abraçar 

esponsais possibilitadores de tornar inteligível essa curioso trabalho estético, que é muito  mais uma seara de formas habitantes de regiões soturnas do humano. 

Mas voltemos ao pintor de Ouro Branco. É por demais interessante observar o quanto de  tradições ou de pintores evocam ou remete, talvez um dos naifs com mais referências  implícitas que o nosso estado acolhe no seu atual panorama de artes visuais, em se  tratando dos chamados ingênuos ou primitivos. Dito isso, vamos por partes.

Lembra, e muito, a maneira como o também naif Heitor dos Prazeres elabora a fisionomia  do humano em suas telas: sempre estão de perfil, sendo que, diferente de Edilson Araújo,  as personagens retratadas perfilam-se em movimento, como se acompanhassem uma  qualquer dança, imprimindo uma graça e uma alegria por se encontrarem face às  vicissitudes, mas com nesgas de soluções abertas por cada um. E por ter e deter a sapiência  como uma sua caudatária, espécie de carta na manga, conseguida na trajetória de dias, eis  o que se comemora do triunfo diante do imponderável das forças da vida, soprando sua  borrasca interminável. 

Sem, contudo, se deixar alquebrar, compreendendo que um fazer parte da vida também é  a necessidade de uma legítima resignação. Penso que nessa forma de ser e de se comportar  há uma resposta que muito mais do que um simples aceitar, é um salto qualitativo que  nos veste com o manto da sabedoria. 

Não posso deixar de lembrar aqui a Arte Egípcia e a obrigatoriedade de uma  representação tendo como pano de fundo a Lei da Frontalidade (pernas e rosto, de lado;  olhos e tronco, de frente). Essa maneira de conjugar as figuras não tem uma regularidade  em todas a telas de Edilson Araújo, algumas fogem a essa lei outrora encontrada nos  afrescos de paredes em túmulos no antigo Egito. 

Evidencia-se, por meio de um conjunto de paradigmas pictóricos, oriundos da tradição da  arte de representar ingênua ou primitiva, uma sempre presente atenção a tudo o que nos  cerca, quer seja da natureza ou da cultura, isso significa deitar um olhar amoroso tanto  sobre os pássaros, árvores, flores, quanto sobre o homem envolvido no seu trabalho, nas  festas ou nas lavouras. 

Contudo, essa maneira de observar presta-se à chance de extrair o sumo que venha a  preencher o vaso insigne da sabedoria e de uma possível arte do bem viver,  compreendendo que o alento primacial encontra-se no valorizar as coisas simples,  outorgando ao que é bom e bonito o status de uma placidez ansiosamente buscada pelo  espírito humano, submetido às tempestades emocionais, às atribulações que chegam de  surpresa, à impermanência e sua lei que diz: tudo é impermanente, só o que é permanente  é a impermanência. Quem havera duvidar de? 

Sendo necessário uma atitude que nos demanda a coragem de reter por nossa conta e risco  à rodagem que nos leva aos aceiros paralelos à estrada principal, o que nominam como  Normalidade. Assim sendo, de certo ponto de vista, viver é escolher o que nos concerne,  os sítios nos quais vicejam identidade e números capazes de definir nossa satisfação,  sossego, tranquilidade, enfim, os campos vibracionais que circunscrevem uma identidade  capaz de nos aquietar e encontrar razões no viver. 

Outra coisa, há excesso de elementos justapostos, dizemos isso no melhor sentido, na  medida em o que o conjunto perfaz uma grande harmonia. Não queremos dizer que essa  espécie de excesso queda-se pura e simplesmente para achegar figuras em diversas cores,  numa profusão que funciona como “enfeite”. Longe de mim afirmar isso. Ora, acontece  que esse fato expede um diálogo com a nossa tradição Barroca. Como sabemos, o Brasil  foi um dos países no qual o Barroco mais prosperou, sendo uma grande parte tardio,  porém não capaz de invalidar, a quantidade e a qualidade obras primas (haja vista o  patrimônio histórico de Minas Gerais e em todo o Nordeste.

Esse ethos ornamental, longe de mim dizer que este suplanta o valor estético, uma vez  que logrou êxito por meio de uma sempre presente harmonia dos elementos que compõem a cena, justapostos quase sempre de maneira arbitrária. Quero dizer, não segue princípios  lógicos, permitindo ao artista conjugar cenas ou figuras sem o uso do que chamam de leis. 

Mais que coisa bonita! Eis o voo de pássaros, árvores com frutos, homens e mulheres na  labuta do dia a dia, dias de comemoração e festas, só uma écloga poderia organizar esse  louvor do mais puro deleite, conduzindo os sentidos a crer, e saber, que a vida não se  limita a inglória luta imposta pelas circunstâncias, tendo aqui os embates do presente e os  anseios e medos com relação ao futuro. 

Por fim, não nos custa discorrer um tanto acerca da cor predominante nas telas de Edilson  Araújo. Causa uma espécie de empatia logo que nos achegamos diante de uma das suas  inúmeras representações, valendo lembrar que todo o espaço em branco é preenchido por  matizes da cor verde, quintessência da natureza. Ora, desde sempre a simbólica dessa cor  esteve associada à natureza e, por extensão, incluir o perímetro de uma semântica  relacionada ao equilíbrio e à harmonia: saúde, frescor, vitalidade. Verde é vida, evocando  à renovação periódica das nossas duas estações: a seca e a das chuvas. Esta é sempre bem vinda e esperada, por meio de calendários que o senso comum manuseia elementos,  superstições, demonstrando sua presença no imaginário de Nordeste. Embora não sendo  possível abandonar os serviços de meteorologia da região.












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