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quinta-feira, 18 de abril de 2024

Especial: Arte e Reciclagem

 Por Márcio Lima Dantas.



Elson Henrique de Oliveira Mesquita, nascido em Almino Afonso, (1988) trabalha com  esculturas à base de reciclagens há cerca de 3 anos. Começou trabalhando no Museu do  Sertão, com o Prof. Benedito Vasconcelos. O surgimento do seu ofício assomou a partir  de ter ficado desempregado. Curioso despertar, para quem tenta compreender os  meandros da arte na alma daqueles que detêm o talento da intuição artística. 

Parece que a vida só quer uma desculpa para ungir alguém com a capacidade de  produzir um objeto de arte, eivado de singularidade e destoante dos demais objetos que  povoam o que chamamos de Realidade. Com Elson, foi o fato de estar desempregado.  Poderia ser qualquer outro? Sim, pois as Moiras (O Destino) são vestidas do elemento  surpresa, nunca deixando entrever o que resguarda para as criaturas. 

Para efeito de compreensão, podemos classificar a obra do artista em duas formas  básicas de construir os objetos. Temos os que são elaborados a partir de sucata, de peças  que pertenceram a engrenagens ou partes de coisas feitas a partir do ferro ou do aço.  Creio que é aqui onde o artista se sai melhor, onde revela um grande senso de  originalidade ao congregar numa peça, - como a elegante cabeça de um cavalo ou um  belo touro -, o conjunto de mínimas peças que pertenceram a outras máquinas, outros  mecanismos. Resta a despótica ostentação de seres paralisados, como a referendar a  capacidade de se reorganizar o mundo a partir do que foi desfeito ou descartado. Um  universo edificado com aquilo que se convencionou que não há mais valor, vindo a ser  obra de arte de grande feitura, com esmero e irradiando beleza para o expectador. 

Creio não ser tão fácil criar a partir do que a sociedade de consumo descartou como algo  que não detém mais valor prático, utilitário, relegando às sucatas, aos monturos e aos  depósitos com sua mescla de inertes peças, num conjunto aleatório. E que tão somente o  olhar sagaz do artista consegue divisar uma outra forma a partir daquilo que é basculho. 

Eis uma alma dotada de sensibilidade artística, que consegue extrair das rumas do que  fora outrora algo uno e como uma função um outro haver, justapondo peças para vir a  engendrar um novo objeto, agora não mais com caráter utilitário, mas com valor  estético, valendo por si e não como parte de um todo. 

A segunda categoria de objetos que Elson constrói tem em vista, sobretudo, animais que  pertencem ao cotidiano do viver rural. É o majestoso touro, com seus belos chifres,  ostentando sua virilidade. Para mim, os mais curiosos são os bodes, mormente um  elaborado com alumínio. Este animal iconifica a capacidade de resistência face a um  meio que nem sempre oferece as condições propícias a um viver mais confortável. Há  que se debelar o clima e a vegetação da caatinga. Nesse sentido, representa o estoicismo 

de quem deve se adequar a um meio hostil, para sobreviver. É consabido a capacidade  do bode de se fazer perdurar diante do que o meio proporciona, sendo capaz de  sobreviver com o que a natureza oferece. 

Algo bastante curioso na elaboração dos bodes é a necessidade que o artista tem de  ressaltar a “masculinidade” desses animais, como se quisesse dizer de uma força atávica  que a natureza imprimiu no animal. As proporções parecem querer dizer de serem  dotados de uma força que os consagra como capazes de enfrentar um meio ambiente  nem sempre favorável, sobretudo na estação seca da região Nordeste. 

Mas o trabalho de Elson não se limita a esses dois conjuntos básicos que aqui  classifiquei. Sua obra é multifacetada, representando desde personagens universais  como D. Quixote e Sancho Pança, até outros mais regionais, como Antônio  Conselheiro. Há uma bela cabeça de águia dourada, de fatura extremamente elaborada.  Essa capacidade de representar ícones que pertencem ao Imaginário Ocidental  demonstra uma rara sensibilidade artística: a de pensar o todo tendo sempre em vista as  partes que serão justapostas, algo não passível de ser elaborado por qualquer um, mas  advindo de uma imaginação que reelabora um mundo a partir do que um outro deixou  de lado, abandonou, tornou sucata, fez de um antigo mecanismo partes largadas em  algum lugar qualquer.



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